Duas meninas desviando do machismo pela América Latina

manucaldas Mensagens: 1403
Ter Nov 14, 2017 10:29 am
Duas meninas desviando do machismo pela América Latina

Eu sempre viajei com a minha família, no mínimo, uma vez por ano. Todas nós amamos passar tempo juntas explorando um novo destino. Por esse motivo, não tenho (ou tinha) costume de viajar com amigos. Minhas únicas viagens sem minha família foram: a clássica excursão de 15 anos para a Disney; e, em julho desse ano, para a América do Sul com a minha melhor amiga.

O roteiro era composto por seis destinos, passando por diferentes cidades do Chile, Argentina e Uruguai. Antes dessa viagem, o único país que eu havia visitado na América do Sul era a Argentina. Quando contava para familiares e amigos sobre os nossos planos para essa viagem, eu ouvia sempre o mesmo alerta, tanto de mulheres, quanto de homens: “Tomem cuidado. A América Latina é muito machista’’.

Eu, como uma jovem informada, engajada no movimento feminista, pensava ''Besteira! O Brasil já é machista pra caramba!’’, em um tom de quem (infelizmente) já é acostumada em ter uma constante preocupação como rotina. Com isso em mente, embarcamos. Duas meninas de vinte anos explorando a América Latina.

Antes de tudo, é importante ressaltar que existem homens mal intencionados em qualquer lugar do mundo. Porém, cada país tem uma cultura diferente. E algumas permitem e normalizam mais alguns comportamentos machistas que outras. E esse relato é apenas a minha experiência, não é uma regra.

Primeiro destino: Chile! Dos três países que visitei nessa viagem, foi o que eu menos passei por situações constrangedoras ou de perigo. O comportamento dos chilenos na noite é bem parecido com o dos brasileiros: um pede pra dançar com você, o outro, mais violento, puxa seu braço, um terceiro insiste por 15 minutos e o quarto fica irritado quando ouve um não. Uma coisa que observei e me incomodou profundamente foi a quantidade enorme de meninas menores de idade nas boates. A noite chilena parece um carnaval fora de época. Para quem, como eu, namora e/ou só quer dançar, é desagradável. Apesar de incômodo, não é algo que nós, como brasileiras, não estivéssemos familiarizadas. E, em comparação com todos os alertas que ouvimos antes de viajar, foi uma boa primeira impressão. Pensávamos estar preparadas para o percurso que tínhamos pela frente, e assim, fomos para a Argentina.

Eu, particularmente, amo a noite argentina. A música é boa, tem boates de vários estilos e o público é jovem. Apesar do flerte nunca ter sido recíproco, porque estava namorando nas duas vezes que viajei para o país, a abordagem dos homens é infinitamente mais civilizada que no Brasil e no Chile. O triste disso é que, como mulher "acostumada" com um tratamento mais invasivo dos caras na noite, eu fiquei surpresa em ser tratada bem. Triste, né? Os argentinos te chamam pra conversar e no máximo para dançar. O que mais me surpreendeu é que a resposta que eu ouvia após os rejeitar, era sempre "Sem problemas!’' e a conversa continuava normalmente. Parece incrível, né? Mas o meu problema na Argentina não foi nas boates. Foi no hotel. No lugar mais íntimo e privado de uma viagem.

Nos hospedamos em um hotel boutique em um dos melhores bairros de Buenos Aires. Até que, uma noite, ouvimos uma batida em nossa porta. Perguntamos quem era e não obtivemos resposta, então assumimos que alguém havia se enganado. Na noite seguinte, a suposta inocente batida na porta ficou violenta. Não era uma só batida, e não era com a força de quem estava perdido. Cinco minutos se passaram e o telefone do quarto tocou. Eram dois homens, que, até então, nunca tínhamos visto na vida, admitindo que estavam nos observando nas áreas públicas do hotel e nos chamando pra sair. Desesperadas, ligamos para a recepção. Ao ouvir a situação, o balconista, apavorado, nos respondeu com um espontâneo palavrão. Descobrimos, então, que os dois homens tinham por volta de 40 anos, estavam na cidade trabalhando, e já haviam feito o mesmo com outra hóspede na mesma semana. Eu e minha amiga ficamos em choque. Denunciar um assédio é sempre muito difícil e aterrorizante. Agora, eles não só sabiam o número do nosso quarto, como tinham sido notificados após a nossa reclamação. A partir dessa noite, nós chegávamos no hotel todos os dias com medo de encontrá-los.

Por fim, chegamos ao Uruguai, onde o assédio tem proporções que não esperávamos. Primeiramente, os bares mais badalados da cidade têm fama de só deixarem mulheres bonitas entrarem, o que é problemático o suficiente por si só. Mesmo assim, frequentamos esses bares tranquilamente, e nada aconteceu no hotel também. O grande problema foi ao andar pelas ruas do centro histórico de Montevidéu. Durante o nosso passeio, fomos interrompidas dezenas de vezes por cantadas de todos os tipos de homens - de pedreiros a empresários de terno e gravata. Mas, diferente do Brasil (ou de qualquer lugar que eu já fui na vida, para ser exata), não é o tipo de cantada genérica que os caras gritam de longe. Os uruguaios, literalmente param você na rua, olham nos seus olhos, e te assediam. Dessa forma: simples e sem vergonha na cara alguma. Essa naturalidade absurda é assustadora.

Como dito anteriormente, essas foram as minhas experiências como uma jovem de 20 anos viajando com uma amiga pelos machismos da América Latina. Não escrevo esse relato para desencorajar ou amedrontar outras meninas, e sim para alertar. Fora esses episódios, essa foi uma das viagens mais importantes da minha vida. Além dos destinos maravilhosos, marcou um momento de liberdade para mim. Mulheres: conheçam o mundo, realizem seus sonhos e aproveitem cada minuto. Mas, infelizmente, ainda precisamos estar alertas o tempo todo, em qualquer lugar do planeta. E isso não significa que devemos naturalizar esses comportamentos. Compartilho essas histórias na esperança que o mesmo não aconteça com vocês.

Você já passou por alguma situação parecida? Onde? Me conta como foi! Precisamos falar sobre isso!

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manucaldas Mensagens: 1403
Ter Nov 14, 2017 12:24 pm
É muito triste que o sonho de conhecer o mundo esteja acompanhado com conhecer as diferentes formas que o machismo estão presentes em diferentes culturas

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zardox Mensagens: 11619
Ter Nov 14, 2017 1:19 pm
Se hoje eu fosse solteiro, certamente as meninas iriam achar que eu sou gay.... :lol:
Quando eu era solteiro, o máximo que eu me atrevia a fazer era dar uma olhada para a mulher.. se ela retribuísse o olhar, a coisa ia adiante.. senão.. parava ali mesmo... sempre me contive ao ganhar um segundo não, ainda que esse não fosse uma simples negação ao meu olhar... ( o primeiro eu já tinha recebido quando não estava olhando...)...
Eu nunca abri a boca para mostrar interesse numa mulher.. era só o olhar... (claro que não rolava "libra" na história.. depois vinha a conversa...)
A tática funcionou +-: todas as mulheres mais ou menos (no conjunto "visual" da obra) que eu olhei, não retribuíram e eu fiquei tristinho....
Já as mulheres consideradas "aviões", que eu jamais pensei que fossem retribuir ao meu olhar, estas, todas retribuíram...para felicidade minha e do meu ego...
Uma delas, inclusive, me fez parar de olhar o "espaço aéreo" a volta....: a minha esposa... ;)

JLito2015 Mensagens: 282
Qua Nov 15, 2017 11:28 am
Eu tenho uma amiga/colega de trabalho que se recusa TERMINANTEMENTE a fazer turismo aqui na America do Sul. Ela (que não é mais nenhuma menina com seus 41 anos) tem ampla experiência em viagens. Já foi por diversas vezes aos EUA, muito mais vezes a Europa e inclusive já morou no exterior. No entanto, por mais que eu fale de Buenos Aires e Montevideo (nem sequer mencionei Colombia, Peru, etc) ela é totalmente contra a idéia de viajar por aqui. E o motivo que ela sempre alega é esse: o fato de ser mulher viajando sozinha.





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