Restituição de imposto pago a Receita Federal

Troca de informações sobre alfândega no Brasil.
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Hugomarcio Mensagens: 3750
Seg Ago 04, 2014 2:47 pm
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Ao retornar de uma viagem internacional a recomendação é sempre declarar suas compras e recolher o imposto eventualmente devido. No entanto, caso você não faça isso e seja escolhido pela fiscalização para uma checagem, é possível que posteriormente, em determinadas circunstâncias, se solicite a restituição do imposto eventualmente pago.

A primeira coisa a ser entendida é que o agente da Receita Federal é soberano no momento da fiscalização. Não adianta chorar, brigar ou ameaçar. O ideal é pagar o imposto e a multa, levar suas compras e depois discutir a questão. Quando do exame da sua bagagem, irão solicitar as notas de compra. Se você apresentar, será necessário discriminar item por item, o respectivo valor, e cobrar o imposto e multa sobre o total apurado.

Por exemplo, se você trouxe US$1.500 em compras. Considerando a isenção é de US$500, a base do imposto de importação será de US$1.000. A alíquota aplicável é de 50%, acarretando um imposto de US$500. Como você não declarou irá pagar 50% de multa sobre o imposto, ou seja, outros US$250.

Caso não seja possível apresentar as notas de compra, o fiscal terá que identificar todos os produtos e procurar na Internet o valor de mercado de cada um. Feito isso, o imposto é apurado da mesma forma indicada acima.

Um dos principais erros cometidos pela fiscalização ocorre quando não é feita a descriminação das mercadorias. Isso acontece principalmente quando são vários itens e as notas de compra não são apresentadas.

Imagine a seguinte situação: Você chega dos EUA com duas malas repletas com eletrônicos de baixa custo e itens para cozinha. Nada caro, mas quando somados o valor pode ser alto. O correto é que cada produto seja identificado pelo fiscal, apurado o seu valor e então exigido o imposto e multa:

1 caixa de som para iPhone: 40 dólares.
2 panelas da Le Creuset: 100 dólares.
4 colheres da OXO: 30 dólares.
1 faca OXO: 20 dólares.
E etc.

Total: 1.300 dólares.

O que pode acontecer, porém, é que por comodidade e preguiça se faça uma indicação genérica das mercadorias, assim como indicação de um valor adotando a técnica do “achismo”:

Eletrônicos: 600 dólares.
Itens para cozinha: 1.000 dólares.

Total: 1.600 dólares.

Tal situação é totalmente inaceitável. Seria o mesmo que você recebesse uma guia de IPVA relativo a “um carro de cor preta”. Não é assim que funciona a apuração de tributos. É indispensável “verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível” (art. 142 do Código Tributário Nacional).

Outro equívoco patente é incluir na cota bens de uso pessoal. Segundo a Instrução Normativa RFB nº 1.059, de 2 de agosto de 2010, bens de uso ou consumo pessoal são “os artigos de vestuário, higiene e demais bens de caráter manifestamente pessoal, em natureza e quantidade compatíveis com as circunstâncias da viagem”.

Como se observa, a norma admite interpretações diversas. Um terno, por exemplo, pode ser tido pelo fiscal como não sendo bem de uso pessoal. Alguns itens de cozinha também, mas se você precisou do terno durante a viagem (em uma reunião ou congresso, por exemplo) ou se utilizou os itens de cozinha (em um apartamento alugado, por exemplo), esses produtos passam a ser pessoais e compatíveis com a viagem.

Vale a pena dialogar com o fiscal, mas como mencionei, se ele insistir na autuação o melhor é pagar e depois pedir a restituição.

Enfim, depois que a raiva passar a primeira coisa a se fazer é acessar o formulário para restituição de indébito no site da Receita Federal: http://www.receita.fazenda.gov.br/publico/Legislacao/Ins/2012/IN1300/AnexoIV.doc

Na primeira hipótese em que o fiscal não discriminou os produtos, após narrar os fatos e mencionar o art. 142 do CTN, que exige a correta definição da matéria tributável no momento de se exigir qualquer tributo, transcreva a decisão abaixo do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda (2ª instância administrativa) que reconheceu a nulidade da cobrança do imposto exatamente nesse tipo de situação:

Câmara: TERCEIRA CÂMARA
Número do Processo: 10140.000374/99-33
Data da Sessão: 06/07/2000 08:30:00
Decisão: Acórdão 303-29365
Ementa: IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. RESTITUIÇÃO.

Não feita à discriminação dos objetos quando da cobrança do imposto incidente sobre bagagem acompanhada, não ficou provado tenha sido ultrapassado o limite de isenção. Acolhida como veraz a argumentação do requerente, de que a cobrança foi indevida e que lhe cabe a restituição.

No segundo caso a questão envolve prova cabal de que os produtos foram utilizados durante a viagem. No exemplo do terno seria com a comprovação do evento no qual você participou e que exigia esse tipo de traje. Já a utilização dos itens de cozinha poderia ser demonstrado através da apresentação do contrato de aluguel, sendo que quanto maior o prazo no exterior mais razoável fica a utilização de um número maior de utensílios.

Tão importante quanto receber o seu dinheiro de volta, é deixar consignado que a fiscalização não pode agir de forma arbitrária. E isso ocorrerá porque o processo, antes de ser julgado, retornará ao fiscal para que ele se manifeste. Quanto maiores forem as reclamações, maiores as chances de que os procedimentos corretos passem a ser adotados.

Importante destacar que não existe garantia de que a restituição será deferida. É uma discussão como qualquer outra, e o prazo de análise pode facilmente chegar a 4 ou 5 anos. Contra a decisão de primeira instância ainda cabe recurso para o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais em Brasília.

O interessante é que todo o procedimento é gratuito e não depende de advogado. E depois que você fizer o pedido, basta esperar e acompanhar o lentíssimo andamento do processo através do COMPROT. De qualquer forma, quando da decisão você será intimado através de comunicado enviado pelo correio.

Por fim, recentemente minha esposa voltou de viagem e a fiscalização perguntou se ela havia viajado para o exterior esse ano, porque, segundo o auditor, a cota de 500 dólares somente poderia ser utilizada uma vez ao ano. Essa informação não é correta, já que segundo o art. 33, §5º, da IN 1.059/2010 a cota se renova a cada intervalo de 1 mês.

Caso ela tivesse viajado esse ano, sendo então lavrado o auto de infração de forma indevida, teríamos mais um evento em que poderíamos pleitear a restituição do imposto.
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baran Mensagens: 10215
Seg Ago 04, 2014 3:20 pm
Muito interessante, Hugo!
segundo o auditor, a cota de 500 dólares somente poderia ser utilizada uma vez ao ano
Isso é ignorância ou má fé do fiscal?

legal03 Mensagens: 136
Seg Ago 04, 2014 3:21 pm
Muito bom o texto.

Só uma correção, Hugo: conforme § 3° do art. 6º do IN/RFB 1059/2010 a opção do viajante pelo canal "nada a declarar", caso tenha bens cujo valor global ultrapasse o limite de isenção, configura declaração falsa, punida com multa correspondente a cinquenta por cento do valor excedente ao limite de isenção.

No texto foi informado que a multa é de 50% sobre o imposto devido, quando na verdade é de 50% sobre o valor das mercadorias que excede o limite de isenção.

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LuisMelo Mensagens: 323
Seg Ago 04, 2014 3:29 pm
Excelente postagem, sempre bom saber dos nossos (poucos) direitos!

OBS: a cota de U$D 500 é ridícula. Passou da hora de atualizar isso.

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Hugomarcio Mensagens: 3750
Seg Ago 04, 2014 3:36 pm
Obrigado a todos.

Baran, sinceramente acho que foi desconhecimento mesmo. Ele conduziu a fiscalização de forma extremamente correta, então não acho que tenha sido má-fé. Mas temos que saber como funciona para podermos nos defender, se necessário.

Legal03, o cálculo que fiz está certo sim. A multa que eles cobram é reduzida em 50% em conformidade com o que dispõe a Lei 8.218/91:

Art. 6º Ao sujeito passivo que, notificado, efetuar o pagamento, a compensação ou o parcelamento dos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, inclusive das contribuições sociais previstas nas alíneas a, b e c do parágrafo único do art. 11 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, será concedido redução da multa de lançamento de ofício nos seguintes percentuais:
I – 50% (cinquenta por cento), se for efetuado o pagamento ou a compensação no prazo de 30 (trinta) dias, contado da data em que o sujeito passivo foi notificado do lançamento;

A multa só será de 100% se alguém for embora sem as malas e não pagar o imposto nos próximos 30 dias, o que acho muito difícil de acontecer.

legal03 Mensagens: 136
Seg Ago 04, 2014 3:42 pm
Obrigado pela resposta, Hugo.

Eu desconhecia esse item da lei que concede 50% de desconto na multa.

Aliás, acredito que 99% dos viajantes a desconheçam, e provavelmente alguns Auditores também.

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Hugomarcio Mensagens: 3750
Seg Ago 04, 2014 3:46 pm
Legal03, a redução é bem tranquila, já que é processada diretamente pelo sistema. Mesmo que o auditor não conheça a legislação, na hora que ele gerar o auto de infração a redução já aparece.

Pelo menos nesse ponto estamos resguardados.

LuisMelo, essa cota é uma vergonha. Nem atualizar eles atualizam.

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JulianaMagalhaes Mensagens: 6026
Seg Ago 04, 2014 3:49 pm
Excelente matéria Hugo! Parabéns!
Aprendi vários pontos que não sabia!

O que mais me irrita nos fiscais é esse "achismo" chutando os valores (o que pode ser bom ou ruim),
Essa do auditor dizer também que só pode utilizar a cota 1 vez por ano foi de matar!





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